Revista Philomatica

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Avatar e seus clichês

Sábado último resolvi enfrentar a chuva e ver Avatar, de James Cameron, a coqueluche da hora. A caminho, um amigo se disse surpreso por ter eu me rendido ao cinema comercial americano. Primeiro clichê: não se deve ler ou ver nada comercial. Mas, cá entre nós, leitor: você nunca, 'nunquinha', teve lá seu dia brega, de estar em um lugar qualquer, ouvir uma música do Fábio Júnior, se deixar embalar pela melodia e ficar com aquela canção martelando por horas a fio no seu ouvido? Ou ter ido ao cinema só para curtir, relaxar, sem se obrigar a papo cabeça, a teorias ecléticas, muitas das quais apanhadas aqui e ali e, sem qualquer fecho que as façam valer por si só? É isso: fui ao cinema, paguei pra ver um filme 3D, só para ter um momento détente. O que tem isso?
É claro que vi clichês desde o início. Impossível não se lembrar da colonização europeia na América, quando essa ainda se mostrava de natureza exuberante, intocada por mãos ambiciosas e menos puras, enfim, quando ainda fazia valer mitos como o do Paraíso na terra (leia Visão do Paraíso de Sérgio Buarque de Holanda) ou o bon sauvage, de Rousseau. Eis aí outro clichê.

Antes que continue a deslindar os clichês, bom saber que eles não são lá muito bem vistos pela crítica. Sinônimos de chavão ou lugar comum, essas expressões idiomáticas, usadas reiteradas vezes, em contextos dissociados daqueles de origem, enfim, gastos pelo tempo, perdem o sentido, e o tiro sai pela culatra, ou seja, têm efeito inesperado e contrário quando usadas, empobrecem o texto.

Talvez seja por isso que muitas cabeças pensantes criticam o filme; excesso de clichês, muito embora se saiba que a crítica especializada tem falado bem do filme. Mas, vamos aos clichês: 1. devassar, sem piedade, um paraíso, nisso inclue-se a população nativa, ingênua e indefesa, subjugada pelo opressor; 2. o opressor é mau mesmo, do começo ao fim da história, não tem piedade ou qualquer nesga de arrependimento como se vê em dramas água com açúcar (no filme o coronel só morre no finalzinho com duas flechadas no peito); 3. o mocinho invasor fica com a mocinha nativa (quem não conhece a historinha de Pocahontas?); 4. o guerreiro ou invasor, seja lá o que for, infiltra-se entre os nativos, conhece seus hábitos e costumes para, depois, melhor subjugá-los; 5. o guerreiro, em combate renhido, irá defrontar o inimigo e derrotá-lo; 6. a mocinha, que também é guerreira, luta heroicamente ao lado do mocinho (aqui, o mito das amazonas, é só ler sobre Francisco de Orellana que, em 1541, rumo ao imaginário País da Canela, aparentemente depois de atravessar a foz do Madeira, deu de cara com as míticas amazonas) e, finalmente, 6. herói e mocinha ficam juntos e felizes para sempre, ou seja, a narrativa, tem até o fim, palavra temporal e lógica, que obedece ao modelo cultural que marca o pensamento de organização ocidental, da poética e da lógica, ou seja, a catarse do espectador está completa - começo, meio e fim, não se deixa o cinema com aquela cara de ué, mas o filme não acabou.

Li muita bobeira de gente mal 'jantada'. Li até que Cameron conseguiu transformar Sigourney Weaver em uma tiazona chata. Outro clichê: chata ou não, quem já não teve uma tiazona? Ou ainda, como fugir do inelutável destino de transformar-se em uma tiazona (isso para elas e para eles!). Comparações com 2001 - Odisséia no espaço, Star wars, Alien, Matrix, etc, que poderiam ter sido ingredientes para Avatar, isso deixo para cinéfilos. Eu quis me divertir e, confesso, viajei nos efeitos e na natureza exuberante mostrada no filme (Puro surto de criatividade! Ótimo.). Esta, mais um clichê: quando a vemos ser destruída não há como não se lembrar do que fazemos diariamente com nosso já moribundo planeta. Aí, me pergunto: a vida não é feita de clichês? Veja-se aqui, na terrinha onde ainda tem palmeiras e o sabiá teima em cantar: não saber de nada já não é um clichê? A imprensa notíciou há dois dias que foi descoberta transferência de verbas da Petrobrás para a Fundação Sarney, (Ele de novo!) e ele, claro, não sabia de nada! Assim, como o Genuíno do PT não sabia que haviam depositado pequena fortuna em sua conta bancária e seu irmão, José Nobre Guimarães, transportava valor equivalente a um prêmio de loteria na cueca, ou mala, sei lá. Exemplos aparecem aos montes: 'o cara' que não sabia de nada (falo do Mensalão), aliás, nunca soube de nada e, mais recentemente, o Sr. Panetone, em Brasília, que embora tenha sido filmado em flagrante ato de propina, insiste que não sabe de nada... É tudo clichê. A verdade é que, clichês ou não, empobrecem... e muito, o país.
Foto: Google Images.

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